Sou a pedra de Drummond
que jamais chegou a ser
castelo de Pessoa
ou jamais chegou a ver
de Sísifo as mãos.
Sou letra redondinha
e fome de leão
carteira vazia
e voz de assombração.
Sou quem me alicia
língua queimada
fantasia.
Sou mesa posta para o jantar
e tristeza repentina.
Sou mãe, irmã, filha, avó
e cama vazia.
Sou manhã de luto
e luta inglória.
Afasia.
Sou feita de percevejos
e pontas de espadas frias.
Sou pimenta malagueta
no canto da boca do dia.
Sou quase nada
do que em mim havia.
Sou tropel, chapéu de palha
porta aberta, verso sem rima,
gaveta trancada,
chave pendurada
no esconderijo de onde
ninguém tem coragem
de pronunciar o nome.
Sou túnel e corpo possesso.
Sou veludo e enternecimento.
Sou cabeça, corpo e coração
separados de mim
para entretenimento
todos na palma úmida
da tua mão...
16.05.2010 - 20h20min
*Da Série - SOBRE QUEM SOU
domingo, 16 de maio de 2010
O que eu sou?
Sou o tudo e o nada na imensidão do paraíso
montada num cavalo alado
unicórnio sem pousada ou sossego.
Sou um poço de desejos satisfeitos
e vontades não reveladas
segredos e milagres rotineiros
desses que ninguém enxerga
nem importância alguma dá.
Sou o passo depois do limite
e a interminável hora do fim.
Sou o que não se conhece
nem se determina
num toque sem instinto
ou num pretenso vazio.
Sou o que se apaga depois da vela acesa
e o som que não se mede
em acordes ou decibéis
ancorados na noite sem estrelas
ou raios de luz de manhãs maquiadas
de sombras e batons vermelhos.
Sou o que não se pensa
nem nas horas mais impressionantes
desesperadoras chances nas camisas de força
dobradas sobre as penteadeiras manchadas
de ilusões febris.
Sou o que não se ganha fácil
nem o que se derrete no fogo.
Sou corpo molhado de chuva
e chuva seca de lágrima
sem motivo aparente.
Sou parente do impossível
e o rasgo na folha de hoje
que pinta meus olhos de azul petróleo.
Sou serpente e sonho à solta
nos campos de trigo seco
pronto para a colheita .
Sou ingresso para o inferno
e fim de inverno de monotonia.
Sou tia do encontro
e prima-irmã da alegria
mas só quando durmo
e meus sonhos me levam
pra onde eu queria.
Sou o fim antes do começo
e a história nunca escrita
no papel de seda rosa
que embrulha o Presente.
Sou vôo de árvore
nas asas da ave-guia
e bengala de cego colorida
mal comportada ponta de flecha
presa no cabo da maçã
de uma certa utopia.
16.05.2010 - 19h37min
*Da Série - SOBRE QUEM SOU
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