sexta-feira, 5 de junho de 2009
Tempo
Na primeira metade do tempo
menti que podia.
Na segunda metade
fingi que sabia.
Na terceira metade
fiquei, à revelia.
Na quarta metade
sorvi o peso do dia.
Na quinta metade
descobri que sofria.
Na sexta, desisti...
De quantas metades precisa
um pretérito mais-que-perfeito?
05.06.2009 - 20h02min
Contração
Persigo o horizonte
caçada ininterrupta
coberta de abelhas mortas
e estradas de areia movediça.
Imito o som que não distingo
afogo as mágoas
na cachoeira do destino
e nas lágrimas que guardei.
Exercito meus dotes culinários
e produzo maravilhas incomunicáveis.
Apimento meu sangue
na moldura do espelho
e devoro os sinais que não entendo
porque sou felina e ferina e faminta
de imagens coletivas
que não sou capaz de discernir.
Engulo a fama de louca.
Aprendiz de marinheiro,
navego em terra firme.
Passeio os olhos pelas promessas
apenas suspeitas
penduradas nas paredes
da sala de trás do parto da rua.
Misturo mel e sal
sobre uma fatia de pão seco.
Assalto o medo
e machuco a queda instintiva.
A multidão vazia
abstrai meus brios
sufoca meus estrondos
encolhe meus nervos
na tentativa absurda
de calar-me o chão.
Tremem meus pentes
nas fronhas das misturas
dos dias escusos.
Escondo o escuro.
Estrela
dolorida
de contração.
05.06.2009 - 19h16min
Criação
Pesco palavras
de terceiras línguas.
A embocadura do sax
não encaixa nas veias avessas
e nas filas sem senha
que assanham os botecos e os livretos
de impostores e viciados pastos
secos de armadilhas e ardis.
Quebram-se as passarelas enevoadas
de quentes hálitos cafeínicos
e chocolates brancos quebrados ao meio
derretidos nos bolsos vermelhos
de sonhos imperfeitos sabores impensados
nem um pouco sutis.
Esmiuço as colunas gráficas
do acervo de insistências
e despedidas acumuladas
pra desmontar motivos
e compreender propósitos
que escorreram dos minutos cegos
em que atentar contra meus próprios versos eu quis.
As mesmas palavras pescadas
de terceiras línguas
em veias devassas
sem senhas
ou sonhos
ou assanhados ardis.
As mesmas palavras
redentoras de poemas
e de problemas que brotam sem trégua
das línguas de terceiros
nos traços que eu fiz.
Assustadoras armadilhas senis.
05.06.2009 - 16h12min
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