quarta-feira, 21 de maio de 2008
É ouro!
As línguas são várias
e os temores, castanhos.
Há que se usufruir da linha
como quem sabe ser essa
a sua última escolha.
A última tragada na fumaça
da vida que se esvai, ligeira.
Os sonhos são castos
econômicos e vastos.
Não são contradições; complementos.
Compreensão é parecida com lamento
quando uma parte pensa que a outra
não merece tamanho tormento.
As linguagens multiplicam
a possibilidade de ação
sobre o objeto móvel
que se atenua na mão
do ourives artista.
Sim, é ouro.
Ouro!
21.05.2008 - 23h59min
Noites de partos pardos
São pardas todas as noites dos gatos?
São gatos todos os pardos da noite?
São partos de gatos à noite?
São noites os partos dos gatos?
São luzes, estrelas, borboletas ou gatos
as claridades pardas da noite?
São noites, gatos, estrelas ou luzes
as borboletas pardas esclarecidas?
São claras as noites sem partos, sem gatos,
sem luzes, estrelas ou borboletas?
São borboletas as luzes dos gatos
na parda noite sem estrelas?
São apavorados gatos partidos?
São pardos os partos de estrelas?
São borboletas pardas?
São gatos claros?
São noites?
São noites
parturientes...
21.05.2008 - 23h41min
21.05.2008 - 23h41min
Exposição
Pendurada no varal, minha poesia
posta à prova pelo povo letrado
que já se vai, que silencia.
Pendurada no varal, minha vida
escorrida entre os dedos do dia
feito pétala desnuda que se desprende
da fantasia, do cabelo, da folia.
A semântica é um detalhe
os livros lidos, mistério
as invenções, os sucessos, questões
em aberto no grande palco
iluminado por estrelas vadias.
Procura-se um genuíno intelectual
entre os prendedores do varal
com os óculos no bolso,
na mão um punhal.
Quer cortar o preconceito
do verso manco, sem jeito
que escrevi sem nem pensar.
Quer sacanear as regras
quer investir às cegas
num único verbo: C A N T A R O L A R.
E eu, ciumenta da minha obra,
observo estática os observadores
que dela tomam uma prova.
Molho a língua n'água doce exposta
e sei que não sou eu
é minha pele, boca, alma à mostra
aos olhos frios que passam
aos bons olhos que me alcançam
e sabem de mim
e me abraçam.
21.05.2008 - 20h28min
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