quarta-feira, 30 de junho de 2010

Carpe diem

A minha arte
é um escudo
contra a morte iminente.
Não fossem meus olhos
que seria da minha poesia?
Não fosse a poesia
que seria da minha existência?
O que há em mim
esfarelo na folha virgem
e garanto mais um dia.
Amanhã
ritual repetido
té que se esgote a íris
e a força do verso
já não me seja suficiente...







30.06.2010 - 02h20min

Estio

Minha inspiração anda órfã
manca
cega
lenta
tolhida.

Espia por entre as frestas da realidade.

Expia as minhas culpas.

Definha.









30.06.2010 - 02h10min

Suspiro

Quisera poder escolher estradas
desbravar terrenos
saber-me suficiente e farta.
Quisera ter outros conhecimentos
e saber deveras
o que deveras sente
aquele que conhece os caminhos.
Eu não sei o que faço.
Não sei se ando.
Não sei se paro.
Não sei se esqueço o lenço
ou se amarro o bode no pau de sebo.
Não sei se cedo
ou se insisto no contrário.
Quisera não ter chegado tão tarde
na hora exata em que os sóis
de todos os mundos existentes
desaparecem
na linha de um mesmo horizonte inglório.
Quisera outras margens
talvez outras respostas
ou, quem sabe, perguntas diferentes.
As minhas dores todas
carrego sozinha.
Acostumada ao peso delas
não me queixo. Choro.
Tranço o sal das lágrimas
e dele faço poesia.
Nenhuma outra alternativa
de sobrevivência.










30.06.2010 - 02h02min

Reflexo

Arrisco um passo em falso
disfarço um atalho
soluço um suspiro
invento solução pra tudo
intuo a solidão do vento.
O reflexo que me protegia
anda mudo

e hoje
sou só lamento...







30.06.2010 - 01h43min

O que é

Poesia
é susto de madrugada
carranca de pirata
escultura de artista
exposta na praça
no meio da calçada.
Poesia
é mais que rima
mais que arremedo
de companhia
mais que pretensa união
de letras e verbos e pretensões.
Poesia
é canção bailarina
menopausa de menina
e sangramento interrompido
na folha vazia
do fluxo do destino.
Poesia
é tropeço e esperança
vocabulário curto
largo latim de criança.
Poesia
é calor e geleira
chuva, vento e cachoeira.
Poesia
é grito
rumor e asfalto.
Pedra de granito.
Incêndio. Terremoto.
Poesia
é lamento e desabafo
barraco desabado
na beira do abismo.
Tormento.
Poesia
é riso e rouquidão.
Mudez madura.
Solidão.







30.06.2010 - 01h40min

domingo, 27 de junho de 2010

Ausência

EU DEIXAREI QUE MORRA EM MIM O DESEJO

DE AMAR OS TEUS OLHOS QUE SÃO DOCES

Porque nada te poderei dar senão a mágoa

de me veres eternamente exausto

No entanto a tua presença é qualquer coisa

como a luz e a vida



E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto

e em minha voz a tua voz

NÃO TE QUERO TER PORQUE

EM MEU SER ESTÁ TUDO TERMINADO.

Quero só que surjas em mim

como a fé nos desesperados



Para que eu possa levar uma gota de orvalho

nesta terra amaldiçoada

Que ficou sobre a minha carne

como uma nódoa do passado.

EU DEIXAREI... TU IRÁS E ENCOSTARÁS

A TUA FACE EM OUTRA FACE.



TEUS DEDOS ENLAÇARÃO OUTROS DEDOS

E TU DESABROCHARÁS PARA A MADRUGADA

Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,

porque eu fui o grande íntimo da noite

Porque eu encostei a minha face

na face da noite e ouvi a tua fala amorosa



Porque meus dedos enlaçaram os dedos

da névoa suspensos no espaço

E eu trouxe até mim a misteriosa essência

do teu abandono desordenado.

EU FICAREI SÓ

COMO OS VELEIROS NOS PORTOS SILENCIOSOS



MAS EU TE POSSUIREI MAIS QUE NINGUÉM

PORQUE PODEREI PARTIR

E TODAS AS LAMENTAÇÕES DO MAR,

DO VENTO, DO CÉU, DAS AVES, DAS ESTRELAS

SERÃO A TUA VOZ PRESENTE, A TUA VOZ AUSENTE,

A TUA VOZ SERENIZADA.





Vinicius de Moraes


















27.06.2010 - manhãzinha

Orinoco

Orinoco, deixa-me em tuas margens

daquela hora sem hora:

deixa-me como outrora partir despido

em tuas trevas batismais.

Orinoco de água escarlate,

deixa-me mergulhar as mãos que retornam

a tua maternidade, a teu transcurso,

rio de raças, pátria de raízes,

teu largo rumor, tua lâmina selvagem

vem de onde eu venho, das pobres

e altivas soledades, dum segredo

como um sangue, de uma silenciosa

mãe de argila.

 
 
(Pablo Neruda)
 
 
 
27.06.2010 - alta madrugada e dois ebooks de Neruda, abertos, diante de mim...
 
'(...) Talvez não vivi em mim mesmo, talvez vivi a vida dos outros.


Do que deixei escrito nestas páginas se desprenderão sempre - como nos arvoredos de outono e como no tempo das vinhas – as folhas amarelas que vão morrer e as uvas que reviverão no vinho sagrado.

Minha vida é uma vida feita de todas as vidas: as vidas do poeta'. Pablo Neruda

 

sábado, 26 de junho de 2010

CARTA

Meu caro poeta,

Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola tracada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!



Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.



A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.



Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: "Eu não te largarei até que me abençoes". Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técninca dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.



Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.



Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convêm, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.



Enfim, meu poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a vinte anos. Combinado?



Mario Quintana

Pra lembrar de Quintana (Como se fosse possível esquecê-lo)

EU QUERIA TRAZER-TE UNS VERSOS MUITO LINDOS
Eu queria trazer-te uns versos muito lindos

colhidos no mais íntimo de mim...

Suas palavras

seriam as mais simples do mundo,

porém não sei que luz as iluminaria

que terias de fechar teus olhos para as ouvir...

Sim! Uma luz que viria de dentro delas,

como essa que acende inesperadas cores

nas lanternas chinesas de papel!

Trago-te palavras, apenas... e que estão escritas

do lado de fora do papel... Não sei, eu nunca soube o que dizer-te

e este poema vai morrendo, ardente e puro, ao vento

da Poesia...

como

uma pobre lanterna que incendiou!



Mario Quintana (Quintana de Bolso)




OS DEGRAUS
Não desças os degraus do sonho

Para não despertar os monstros.

Não subas aos sótãos - onde

Os deuses, por trás das suas máscaras,

Ocultam o próprio enigma.

Não desças, não subas, fica.

O mistério está é na tua vida!

E é um sonho louco este nosso mundo...



Mario Quintana - Baú de Espantos





SIMULTANEIDADE
- Eu amo o mundo! Eu detesto o mundo! Eu creio em Deus! Deus é um absurdo!
Eu vou me matar! Eu quero viver!

- Você é louco?

- Não, sou poeta.



Mario Quintana - A vaca e o hipogrifo (Poesia Completa, p. 535)



SEISCENTOS E SESSENTA E SEIS
A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.

Quando se vê, já são 6 horas: há tempo...

Quando se vê, já é 6ªfeira...

Quando se vê, passaram 60 anos...

Agora, é tarde demais para ser reprovado...

E se me dessem - um dia - uma outra oportunidade,

eu nem olhava o relógio.

seguia sempre, sempre em frente ...



E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.



Mario Quintana ( In: Esconderijo do tempo)





CANÇÃO DO AMOR IMPREVISTO

Eu sou um homem fechado.

O mundo me tornou egoísta e mau.

E a minha poesia é um vício triste,

Desesperado e solitário

Que eu faço tudo por abafar.



Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,

Com o teu passo leve,

Com esses teus cabelos...



E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender

nada, numa alegria atônita...



A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil

Aonde viessem pousar os passarinhos.



Mario Quintana



O SILÊNCIO
Convivência entre o poeta e o leitor, só no silêncio da leitura a sós. A sós, os dois. Isto é, livro e leitor. Este não quer saber de terceiros, n ão quer que interpretem, que cantem, que dancem um poema. O verdadeiro amador de poemas ama em silêncio...



Mario Quintana - A vaca e o hipogrifo







PROJETO DE PREFÁCIO

Sábias agudezas... refinamentos...

- não!

Nada disso encontrarás aqui.

Um poema não é para te distraíres

como com essas imagens mutantes de caleidoscópios.

Um poema não é quando te deténs para apreciar um detalhe

Um poema não é também quando paras no fim,

porque um verdadeiro poema continua sempre...

Um poema que não te ajude a viver e não saiba preparar-te para a morte

não tem sentido: é um pobre chocalho de palavras.



Mario Quintana

terça-feira, 22 de junho de 2010

Pós

Depois do passado
um pouco adiante do presente
nada é o que se apresenta
nada além do que se pressente
nenhuma conquista de fato.
Depois do passado
um punho fechado
e um presente embrulhado
com papel alumínio gasto.
Um sopro.
A vela despede a chama.
Na cama
um futuro enfumaçado.
Depois do passado
um lamento...





22.06.2010 - 03h06min

Insignificante












Farta,
a falha admite
a vertigem.

Compreender exige energia
.










22.06.2010 - 01h08min

Luta

Contra o vento
investem as tormentas.
Nem um
nem outro
vence.
Vaidade.






Aos 26 minutos do dia 22.06.2010

Rasgo


A sorte
na folha
 voa.

Seca,
a garganta recusa
um gole de palavra.

Brusca,
a busca treme.

Pálida semelhança.






Aos 8 segundos do dia 22.06.2010

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Fotografia






Amarelar...
ir perdendo a cor e o viço
desfibrar as tramas
do papel antigo.

En
ve
lhe
cer

(se)
.
.
.






21.06.2010 - 23h50min

Um brinde...



... ao abismo...




Inerente à festa,
o precipício.


Erguem-se as taças
e os conteúdos respingam
na gola da camisa  da escolha.
Tudo se perde.






21.06.2010 - 23h21min

sábado, 19 de junho de 2010

A outra




Sou só mais uma
de todas as tantas outras




que moram em mim
(e em ti)...





19.06.2010 - 13h55min

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Sou

Eu sou, sem nunca ter sido eu.


Ou talvez tenha sido um pé e uma cabeça.

Um ET invertido.

Uma invenção pela metade.

Um soneto sem rimas.

Uma planta engasgada

na garganta do Planeta Azul.

Eu sou, sem nunca ter tido eu.

Ou talvez tenha tido uma fé e uma cachaça.

Um elo dividido.

Uma saturação da verdade.

Um lamento com cifras.

Uma raça enganchada

na bainha do firmamento anil.

Eu sou o fio de cabelo

do Corcunda de Notre Dame,

o cisco no olho do profeta louco,

a folha rasgada do livro maldito,

a Bíblia dos desesperados,

a prisão dos aflitos,

a caneta vazia, esquecida na mesa gelada.

Eu sou a tela clara

a tinta escura

a cor espremida na teia de aranha

que não escalou o Everest

mas que conhece o calor do verão

do lado de baixo da Terra.

Eu sou arrependimento

e coragem,

impertinência,

vertigem,

voracidade.

Eu sou a sexta-feira

do feriado prolongado

e a santa no altar da igreja abandonada.

Eu sou o guarda-chuva

e a chuva que te molha.

O canto escuro

o muro pichado

e a fumaça do talento

que disfarça

e não acontece.

Eu sou um nó

um eco

um pente.
 
 
 
 
 
 
18.06.2010 / 20h46min

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Mulher sem rosto

Pingo nas tintas dos meus começos





Respingo meus contornos vagos






Não tenho rosto






Só uma alma sonâmbula
perambulante ofensa aos usos e costumes
impaciente ante os desditos do mundo.



17.06.2010 - 01h05min




Considerações

TRANSPAREÇO-ME






DILUO-ME







DESAPAREÇO-ME







SEM MIM

SOU JEANS BATIDO

E UM PUNHADO DE PÉROLAS FALSAS.






Aos 49 minutos do dia 17.06.2010

terça-feira, 15 de junho de 2010

REMORSO DE GAÚCHO...'

Um gaúcho entra na delegacia de polícia em Uruguaiana e dirige-se ao delegado:



-Vim me entregar, cometi um crime e desde então não consigo viver em paz.



- Tchê, disse o delegado, as leis aqui são  brabas barbaridade e são cumpridas e se o tu és mesmo culpado não terá apelação nem dor de consciência que te livre da cadeia, mas fala...



- Atropelei um argentino na estrada BR-472, perto de Itaqui.



- Ora xirú, como tu podes te culpar se estes argentinos atravessam as ruas e as estradas a todo tempo?



- Mas o vivente estava no acostamento.



- Se estava no acostamento é porque queria atravessar, se não fosses tu seria outro qualquer.



- Mas não tive nem a hombridade de avisar a família daquele cüera, sou um porqueira!



- Bueno, se tu tivesses avisado haveria manifestação, repudio popular, passeata, repressão, pancadaria e morreria muito mais gente, acho que tu és um pacifista, mereces uma estátua.



- Mas senhor delegado, eu enterrei o coitado do homem ali mesmo, na beira da estrada.



- Tá provado, tu és um grande humanista... enterrar um argentino... és um benfeitor, outro qualquer o abandonaria ali mesmo para ser comido por urubus e outros animais, provavelmente até hienas.



- Mas enquanto eu o enterrava, ele gritava : 'Estoy vivo, estoy vivo!'



- Garanto que era mentira dele, esses argentinos mentem muito!!!!
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
*Li no orkut. Quase morri de rir...hehe...
Sim, eu sei que não é poesia. E daí?

Ilusionismo

Se calas
consinto.
Conceituo meus limites
nos argumentos do espaço-tempo
aos quais estou presa
por absurda necessidade do destino.
Se consinto
escalas
as paredes das horas
e os confortos dos alinhamentos
nas quadradas janelas
que dão pra lugar nenhum.
Se falas
desminto
as rebuscadas patrulhas traduzidas
em frases dispersas
misteriosas salas d'alma
onde escondo meus rumores
e os humores obtusos.
Se amas
sinto
os traiçoeiros ramos
de venenos intactos
e detalhados sentidos
de edições moderadas
e desacertadas precauções mil.
Se danças
pinto
o quadro de movimento intenso
nas traduzidas contrações
de blusas e cintos e somas.
Ilusões.







Na primeira meia hora do dia 15.06.2010

Agora

Hoje eu parto
meu pão esmago
meu suor, com mãos trêmulas,
seco.
Hoje eu participo
de um particípio passado
presente na lembrança
do que não cheguei a viver.
Hoje eu desmancho
meu tricô de versos
os pontos costurados
nas costumeiras madrugadas
de vagas diretrizes.
Hoje eu capricho
na invenção de uma verdade qualquer
que me sustente
sobre os saltos altos do meu ego manco
e sobre as manchas expostas
do meu sangue partido ao meio
de franjas e entalhes de couro cru.

Parto, hoje,
as favas contadas
os favos melados
as inexistências e
as imprudências.

As partes estão prontas
as cartas sobre a mesa
os fartos fios de navalha
os frios, os fracos, os filetes
os flancos, os fiapos...

Parto.





Aos 19 minutos do dia 15.06.2010

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Reviravolta

Eu já tinha desistido
Eu já tinha largado de mão
dessa mania de escrever
tudo o que me vem à mente
tudo o que não posso dizer.
Eu já tinha plantado minha árvore
de frutos pintados de aquarela
e surtos bipolares diários.
Eu já tinha comprado um capuz vermelho
e sorrisos de plástico
pra estampar nas páginas vazias
de um blog fantasma
com vento desértico
e sopros de enguias esqueléticas
entre as teias de aranha
abandonadas nos cantos virtuais
dessa semelhança com uma vida de nada.
Eu já tinha decidido esquecer a senha
e publicar o silêncio
nas linhas paradas que eu não construí.

Mas

Eu mudo de idéia a cada banho
como se a água aquecesse meu peito vazio
e a solidão me obrigasse o grito
talvez a escrita de uma letra torta
- pretenso desabafo-.

E aí
voltei atrás
rabisquei um traço aqui
outro ali
um terceiro acolá
e a página branca
manchei de lilás.

Té que eu decida
desistir
de novo
e mais
uma vez...



Faltando 10 minutos para o dia 15.06. 2010

domingo, 13 de junho de 2010

Criação

Perco a palavra.


Construo sentenças involuntárias.

Avanço um passo parado enquanto

A erudição me proíbe

De andar descalça

Entre as vírgulas impressas

Nas culpas da arte duvidosa que produzo.

Estabeleço parâmetros

E os rituais marcam as conclusões precipitadas

Nos pactos permanentes.

Assumo as estradas

Pelas quais embalo meus impossíveis sonhos.

Nas minhas pretensas criações
 
Permaneço.
 
 
 
 
 
13.06.2010 - 03h13min

Sampa

São Paulo é um enorme coração. Enfartado.


Farto de gentes e mundos.

Enfastiado de versos marginais.

Faminto de verdades e semelhanças

com cotidianos reais.

São Paulo é uma nota

embebida em álcool

e diluída em lama.

São Paulo é toda uma República à parte.

Um coração selvagem.

Enfartado.

Farto de gentes e mundos.

Enfastiado de versos digitais.

Fantasiado de fomes

e novidades irreais.

São Paulo é um fato.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13.06.2010 - 03h02min

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Desconexo

Não gosto do sempre igual
mas também não gosto
do que aplicação alguma tem.
Os símbolos me determinam
as inconstâncias me acusam.
Assaltou-me a alma uma inquietude devassa
procurou meus temores e admitiu o princípio
de um orgulho obtuso e suspenso
por correntes brilhantes de anéis sem dedos.
Não ando sobre ovos
por medo de quebrar os pés.
Evito as encruzilhadas
pra não comer as pipocas das galinhas degoladas
deixadas de lado pra uma divindade qualquer.
Não divido meus tesouros nem alimento negativas
que sei que não terei forças pra cobrar.
Sou qualquer coisa confusa, perdida entre
uma e outra ponta do iceberg derretido
que eu não soube navegar.
Fui um laço estranho na antena da abelha
e uma velha melodia solta
nos ouvidos da festa de cores
que dançam na ponta da tua voz.
Sou a gota da lágrima que escorre da tua boca
e o delirium tremens no fundo da garrafa
sem cicatriz.
Arrependo os mapas e as legendas
viro assombração e laminada herança
nas letras que brotam das pontas dos meus dedos
ansiosos por dizer.
O que?
Qualquer coisa que se assente
entre os acentos dos vocábulos sem sílabas tônicas
sem musicalidade, sem quase algum .
Paralisia de estrela
cansada de arder respostas.
O caminho de pétalas de rosas existe
e assume proporções de fôlego exposto
nas palmas das mãos suadas
e nenhum outro privilégio
além de no impossível acreditar.




11.06.2010 - 02h03min

terça-feira, 8 de junho de 2010

Mil de mim

Duas de mim, conheço bem.


Uma me diz que não cresci

a outra me leva a crer que já morri.

Enquanto uma me alimenta de sonhos

a outra rouba-me a comida

e me quer emagrecer.

Se esta me puxa o tapete

a outra arranja um vermelho-chamativo-brilhante

pr'eu nua desfilar, sem platéia

mas também sem nenhum limite.

Uma me arrepende e culpa

a outra me liberta, arremeda o medo,

desafia o que me prende.

Esta é indecente

aquela é solidão.

Se uma ri solta e devassa

a outra sorri, e tapa a boca com a mão.

Quando aquela acredita

em contos de fadas

a outra planta bem firme os pés no chão.



Sendo duas já ando às voltas

com remédios sossega-leão,

imagine se eu, casa delas,

permitisse a descoberta

- pecado capital! -

de que dentro destas

existem outras mil...






Aos 8 segundos do dia 08.06.2010

domingo, 6 de junho de 2010

Perfeição

Os assuntos que nos interessam
pertencem aos nossos espaços comuns
de afetos e cuidados trocados.
A compreensiva cumplicidade
adornada de poéticas histórias
e pulsantes sonoridades.
Teus traços
teus movimentos
a simbologia nos gestos
as frentes assumidas
e os encantos.
Os sons que nos interessam
pertencem aos nossos ouvidos atentos
de harmoniosa  e única sensação.
Nossos laços
permanências
e lábios
contam mistérios
apenas sondáveis
por nossas almas
carinhosamente abraçadas
nas curvas de nossos corpos
enfeitados de nuvens
e de verdades.
As nossas.
As que queremos ter.






06.06.2010 - 01h12min
Porque hoje está plantado em nós.
Hoje-ontem está-tem sido-foi mais que perfeito.
Ontem, hoje, amanhã. As nossas vontades.
As nossas verdades. As nossas vidas. Nós.

sábado, 5 de junho de 2010

Para depois de amanhã

Um nó na linha do tempo
e o absurdo itinerário
da viagem impensada
torna-se diário
escrito na linha imaginária
de lua apagada.
A fotografia congela o enredo
influencia a direção dos dedos
sobre o teclado macio de silicone
que imprime a digital de ontem
porque hoje já virou amanhã
no instante seguinte
ao que passou.
Envelhecemos tão rápido
que as pupilas dilatam o espaço da luz
e os sentidos se apercebem
tardiamente
que o sono e a falta dele
são indícios de anomalia que reduz
a produção de senso de estética geral.
Cá me encontro
entendendo sempre menos
do que me foi permitido saber
citando nomes mortos
de imortais pensamentos
universais desejos de apreender
a rota certa
no mínimo a menos errada
ou a que for possível escolher.
Entre devaneios e passeios
pelas anuviadas sendas do quase sonho
busco o que permanece
o que poderei acompanhar
ao longo de uma existência
cujas limitações chegam a ser ridículas
das quais não ouso suspender
sequer pequena ilusão.
Não.
Mantenho o que me haverá de acompanhar
ao longo da jornada curta
que eu pretendo eterna
enquanto durar
(Vinícius gostaria de saber
que o elegi meu guia
um dia
talvez).
São dois lados que eu tenho
e duas mãos quentes e apertadas
segurando as minhas
à esquerda, a mãozinha infante
à direita,  a mão forte
do homem que atravessou os verbos
os universos
e as impossibilidades
pra ser meu
e comigo estar.











05.06.2010 - 06h02min
Antes de entregar-me à morte diária
depois de entregar-me a Asimov
durante a entrega e-terna ao príncipe guerreiro,
dono do meu tempo, dos meus sonhos e de todos os versos
qu'inda nascerão de mim...

quinta-feira, 3 de junho de 2010

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Ensayo para el fin del mundo

La lengua no se levanta

para la invocación

el pensamiento reune

la ceniza más allá del tiempo

y todo el silencio y todo el olvido

rastro boquiabierto, todo lo llena

un vacío por el que conjuro

despliega su luz





Un buen día reviven las palabras, se vuelven

por un camino sinuoso y simultáneo, corren

bajo el agua y sobre la superficie

aliento





La invocación cruza en sombras a la noche, y no hay luz

ni hay raíz ni fuego y ni hay palabra que no se encienda





Al final del mundo, al final, sólo un ensayo

un otro comienzo que, lenta y pausadamente

se repite desde siempre





Y al principio es la palabra del corazón

impregnada de su claro magnetismo

y al principio (tomado del final), la palabra

que se alza silencio en el silencio, callada





luminosa





interior
 
 
 
 
 
 
 
Roberto Amezquita
02.06.2010

Todo dia

O futuro que te guarda
visita o passado onde te espero
de olhos abertos
e suaves lábios de beijo.
Tuas sobrancelhas
o brilho nos teus olhos
as mãos que tocam as cordas
da preciosa guitarra
tudo me planta sorrisos
n'alma plena de desejo.
Rasgar as madrugadas
eu no teu ontem
tu no meu amanhã
juntos no espaço mágico
inventado por um gênio
graças ao qual trançamos os laços
que tão fortemente nos colam
eu ao teu peito
tu à minha vida
independente de tempo verbal
ou ponteiro de relógio
ou impossibilidades
ou curvas de espaço.
Um no outro
somos.
Ontem
hoje
amanhã
eu, tua.
Pra sempre.






02.06.2010 - 01h13min
Longe? Mais perto que nunca.