segunda-feira, 20 de julho de 2009

Trilha

Destelho o que me cobre

desenterro meus cumprimentos

sentencio meus desejos

e minhas pragas aos quatro ventos

na rosa dos tempos perdidos.

Sou conquista e contratempo

sou diversas lidas e outros unguentos

sou terço rezado na sexta-feira santa

e rito pagão cumprido à luz da lua.

Desespero a escolha

e começo de novo, do nada.

Visto a mortalha e deito na estrada

esperando o trem eterno.

Não sei mentir que sei o que emudeço.

Se amanhã eu estiver estremecida

é que meus brios se esgotaram

nos nervos que meus dedos permitiram

que se entrelaçassem sem custo.

Se hoje esqueço a hora
e perco de vista meus assombros
é que o cachecol enrolou os minutos
e eu peguei no sono que destila vãs vinganças.
Se ontem à toa sofri
é que as visões esvairam-se
entre os dedos da madrugada
e os começos derreteram as estacas
cravadas no coração da terra de ninguém.
Se aqui estou
é porque há vácuos e mútuos escombros
entre o que está por vir
e o que já houve
n'algum tempo obscuro
n'alguma falha de muro
n'algum reduto perdido
entre o que inventei
e o que poderia ter sido
se eu houvesse permitido.
Ou tu...
20.07.2009 - 10h

Questões

Se motivos eu não tivesse motivos eu não daria pra receber o farto livro de mentiras e de soluções mal quistas nos entrelaçados cordões umbilicais que me enforcam pra não dizer que me atrelam a um passado que eu não foquei mas que carrego às costas: corcunda desconfortável sem previsão de deixar de existir. Sou sopro esvaído da boca d'algum vento errante que sumiu bem no meio do deserto; daí essa imensidão de vazio e esse calor debaixo dos pés que me arranca as peles e as feridas descascadas de cansaço. Não passo de uma breve passagem que nem pegadas deixa atrás de si; nenhum vestígio de luta nem de desejo nem de conforto. Conforme passam os dias deterioro os pensamentos que não tive não compro gato nem lebre nem lembrança alguma dos fantasmas que pertencem aos mercados guardados nas minhas entranhas. Eles me acompanham embora não os veja mais. Eles me devoram me denunciam desdizem meus feitos sem dó nem piedade e consideram piegas essa minha doença que me arranha a garganta seca de palavras não ditas. Apaixonadamente percorro minhas estradas destituída de qualquer ambição devorada por minhas contradições todas. Comparo as curvas e fecho as cortinas. Não gosto da viagem gosto do porto desnudo gosto da porta aberta nem sempre às vezes a porta fechada é um alerta ou uma pretensão nunca uma proteção. Cerro as venezianas e encontro teias de aranha nas dobradiças enferrujadas. Sem canções tristes, tudo fica meio cinza, as árvores não balançam nem os pássaros conversam entre si. Sem canções tristes não escrevo nem faço meus rabiscos que ouso de desenhos chamar. São meus são pra mim são frutos do grafite que eu gosto sem gasto ou defeito de luzes. São minhas curvas e meus açoites. São meus gritos. Restos das sobras do que haverá de ficar de mim... Não são pegadas são nós frouxos pra serem soltos por quem me vir. Por ti... 18.07.2009 - 15h