segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Implícito

Troquei visita com as tuas cruzes
e as faixas penduradas nos teus armários
manchadas de cicatrizes.
Não vi teu riso
extinto há tempos
dessa tua boca surda.
Contei os pontos
dedilhei as cordas
suavemente.
Sem pejo
vasculhei as iras
ironizei as luas
frias
cruas.
Tranquei a visita
num canto do medo.
Intimidei o corte.

Voei.







25.01.2010 - 16h12min

Tombar

O meu amor 
é um cabo de guarda-chuvas
virado do avesso
sem préstimo algum
sem data de fabricação
nem nome do proprietário
nem nome do inventor.












25.01.2010 - 16h04min

Tambor

Fisguei o canto da letra
guardanapo vermelho macio
desperdício ilusório
canção de galo arredio.
Desfiei o valor do salário
na vírgula cansada
no tremor do arrepio.
Não ousei dizer o contrário
nem amparei a nuvem cinza
sobre a frase errante
de doentes bordas virís.
Pisei fundo e vilipendiei
os deuses
os astronautas
os inventores de leis.
Construí o meu mundo
e nele me instalei.

Pago meus erros
meus pecados
meus defeitos
todos
sem cuidado
ou alívio
ou saber.

Meu mundo
tem quatro carvalhos
e uma janela
vazia de imensidão.

Escrava falsa
aceito o fado.

Danço na última cratera da lua
no último anel de Saturno
na última estrela que brilhar.

Escrava falsa
'proibido se queixar'...






25.01.2010 - 15h58min

Quem é você?






Pois essa mesma pergunta 
ao meu espelho eu fiz 
e ele responder não soube.
Ficou todo atrapalhado, o infeliz! 
De manhã me disse que eu era uma louca

despenteada
inchada
amassada 



sem 


sal! 


À tarde mudou de idéia
inventou-me um brilho tal
de madrasta ou de medéia
que não sei d'onde tirou. 


À noite
pra surpresa de quem pergunta
sem menos nem mais 
chamou-me artista,
que de tudo sou capaz. 


No dia seguinte
sem papas na língua
desfiou-se em predicados 
que não sei onde encontrou. 
Entre os bons 
e os menos citáveis 
fiquei com o mais provável
embora ainda tão 
deficiente
e incompleto




MULHER SEM RIMAS
(assim mesmo
é o que parece...).














25.01.2010 - 15h20min

Vácuo


Aliança gasta
ocre gosto
castanho suor.
Vibram as farpas
nos perfumes amadeirados
nos finos linhos do Sim.
Sons diluídos na vertigem
malhas de algodão macio
retratos amarelos no jardim.
                                                     Se é verdade que tudo passa
                                                     porque essa falta não tem fim?



25.01.2010 - 12h50min

Responsório





E se a canção
sem acompanhamento
um canto à capela
for solitária
- a solidão é sempre um começo -
e os sinos dobrarem
sem aviso
ou prévio motivo,
se os quadros
embaralhados
e suspensos nas cercas
estiverem cansados
e previstos ensaios azulados
atenuarem os princípios,
então a manhã abrirá outras portas
outros suspenses
outras palavras
pra gente acreditar de novo
e mais uma vez...




25.01.2010 - 12h05min