quinta-feira, 14 de julho de 2011

Poesia

Fértil é o dia
em que brotam letras
bolhas de sabão
grafitadas
na folha virgem medida.
Qualquer motivo é verso
a ajuda pedida
e negada
o botão entreaberto
o aperto no peito
a linha do trem
a nova oração
o espelho quebrado
o medo invertido
a emoção.
Qualquer razão é bastante
o dente do siso
a farda verde
o fardo dormente
a circunstância
a pompa
o absurdo
o inconsequente.
Qualquer imagem é presente
inclusive a de mil novecentos e oitenta e cinco
ou antes
ou dois mil e onze.
Fértil nascença de estrofes.
Alimento.







14.07.2011 - 19h55min

Possessão

A realidade que eu guardo
é a ponta do grampo
de uma fotografia
que o delírio me permite possuir.
O que meus dedos tocam
são meus minutos-limites:
é o que eu tenho de meu.
Meus sobrepostos pertences
estão no meu hoje.
Meus remendos
imprestáveis pressupostos
de esquecimentos.
Eu sou o que hoje guardo
nas entrelinhas
das minhas medidas
feixes de nervos expostos.
Exporto dicionários
de cicatrizes perfeitas
e sinônimos duvidosos.
O que adivinho
o que suspeito
imagino
sonho
ou desejo
é ilusão.
O que me esvai dos dedos,
lembrança.
O que tenho
de fato e de direito
é o agora
e é nele que eu me liberto
é dentro desse mito
que eu moro
e suo
e sou.



14.07.2011 - 18h35min

Crença

Rasuras nas luvas
com que o vento
conta as gotas de hoje
nas íris embaçadas
das catedrais brancas
que esperam fiéis.
Contratos rasgados
incendiadas preces
violentas cenas paradas
nas veias fechadas
de uma América outra
que não a latrina
que não o latido uivado
d'alma desesperada e aflita
presa em si mesma
ensimesmada
loucura.

Rabisco.




14.07.2011 - 01h44min

Jamais

Nunca
é um tempo de por enquanto
que se arrasta ao longe
das gotas lânguidas
do escorrido relógio
de Dali. Daqui
nada se vê
além de agora
e o que não penso
é quase estrada trilhada.
O Nunca afirmado
pode ser Sim ou Não
depende da distância
entre o Sempre e o
tiquetaquear da vontade
prevista ou In.
Nunca é um tempo de por enquanto
enquanto durar a hora
arrastada de cascalhos
e repentes chuviscos
rebentos de listras azuis
nas calhas encarceradas
que pingam esperas
e corredores vazios.
Por enquanto
inda insta o orvalho
que não mais se esvai
nas frases do tempo
escoado dos quintais
da vida de dentro de mim.
Por enquanto
o Nunca aguarda
a calçada despretenciosamente
limpa
ventanear outonos
de folhas amassadas
e desistentes esperanças
tidas.
Nunca
é agora
por enquanto.


14.07.2011 - 01h04min