sexta-feira, 23 de maio de 2008

Processo

Admito o cúmulo da audácia de repetir-me a mim mesma nos versos que faço. Concentro força e energia na esfera de vidro que é meu grito metamorfoseado em agulha e linha pra costurar as frases sem vírgulas os ditos, os não-ditos, os bem-ditos os mal-ditos formados pra impressionar a mim mesma nas horas em que procuro um pouco d'água pr'essa minha sede... 23.05.2008 - 14h42min

Semente

Planto versos onde pretendo colher poesia... 23.05.2008 - 04h01min

Imagem

Rasgo o peito na densa e solitária escuridão ensangüentadas letras paridas na dor escorrem ao longo da página... Se queres meus porquês e meus sonhos plantados nas palmas das tuas mãos as mesmas mãos que jamais alcançaram as minhas impedidas pelas distâncias insondáveis das placas das estradas dos sentimentos inenarráveis ou sequer existentes, liberta a voz rouca, latina latência das madrugadas sem testemunhas ou confessos pecados mortais. Rompo as cadeias da gangorra do tempo. Cheguei antes e me atrasei. Sou rastro na areia escaldante pé de vento uivante, minuano no deserto a cantar pra ninguém. 23.05.2008 - 03h58min

Noite insone

No meio da noite insone incendeio as pontas dos dedos e ardo na folha em branco entregue ao transe da escrita externado o sentido da vida de todo o poeta que se esvai dividido entre os dias normais e os dias que são noites para todos os outros mortais. No meio da noite insone busco razões pra dizer teu nome teu cheiro teu jeito tuas cruzes teus poderes tuas vertigens teus prazeres tuas origens. No meio da noite insone sem pregos sem tinta sem sono emprego meu tempo na única coisa que garanto: escrever poesia de nada que de tudo já tem de monte. No meio da noite insone fuço entre os furos das letras redondas feito louca bordadeira de ondas e não encontro e não desmancho o fio da meada da agulha nova que haverá de trazer à tona o que há comigo assim insone sem motivo... No meio da noite insone um anjo malvado me disse que amanhã não é feriado e que o raiar do dia reserva cicatrizes e dores diversas. Ah, eu sei... não tenho pressa... 23.05.2008 - 03h16min

Instrumento

Sou corda de violão
tensa e preparada
pra dar o tom
a nota
que teus dedos buscam.
23.05.2008 - 02h17min

União

Força e suavidade juntas são pontas de flechas embebidas em veneno eterno. Força e suavidade juntas prendem em nó de marinheiro. Pra desatar, nem os deuses, nem mandinga; não adianta chorar. 23.05.2008 - 01h54min

Firmamento


Nas asas do anjo que não voa
conheci a noite e as estrelas e
apertei a mão da lua e dos planetas.
Criei curvas e risquei palavras
como quem não precisa de canetas.
Ri alto e sem cuidado
bocejei, mergulhei, espreguicei
as nuvens e suas primas
as borboletas azuis.
Sim, há borboletas azuis no firmamento
entre os anjos e os poetas
entre os encantos e os profetas
entre os amantes e as setas
que indicam o caminho da próxima rima
talvez logo ali, no paralelo trinta,
ou talvez mais além,
bem em cima
de Greenwish.
Elas voam abraçadas
em imensas revoadas
daí o céu ser azul.
Não sabias?






23.05.2008 - 02h03min

De deuses e heróis

Deuses são intocáveis. Dançarinos na imensidão do céu, observadores dos nossos trôpegos passos. Mortais, tu e eu. Passageiros na agonia das dores espiralhadas dos dias que se esvaem em noites frias. O quarto, o quinto, o sexto, o décimo, que seja, elementos a mais na junção das estrelas que demarcam os caminhos já traçados e os que haverão de ser. Deuses, cujos poderes exalam perfume de verbos frescos. Sorridentes fragrâncias vermelhas, té onde teus olhos alcançam... Té onde possa ser.... 23.05.2008 - 01h41min

Seu moço

Pra me acompanhar não é bem assim, seu moço. Tenho alma repentista na ponta da língua sempre um verso solto pronto pra ser devorado por mim ou por ti depende de quem primeiro beijar a palavra capaz de desencadear o poema inteiro, seu moço. Ah, seu moço, pra me acompanhar não é bem assim meu sono é traiçoeiro passa ao largo do meu travesseiro não quer saber de mim. Pra me acompanhar, seu moço, fique sabendo que não é bem assim... 23.05.2008 - 01h17min

QUARTO

Três versos sem pestanejar criados a partir de sonhos ou de um novo linguajar. Três versos meio impróprios pra menores de mil anos por suas linhas dissonantes por seu tom desconcertante. Três versos ardentes que fervem de dor e medo e covardia do azul profundo de águas distantes da terra desconhecida que nem mar tinha. Três versos querendo crescer e chegar logo ao quarto, ao quinto talvez... Não, o quinto já tem pai com nome esquisito. O quarto verso guarda a pergunta que escorre pela garganta perdida entre as entranhas do poema que ainda nem nasceu. Por onde andará esse elemento que responde por quinto? Onde foi que se escondeu? 23.05.2008 - 01h09min

Travessia

Atravesso noites os dissabores se perdem na escuridão pincelada de azuis estrelas cristalizadas. Amanheço poentes e proponho a poetas ausentes que se apresentem sem papel ou caneta na mão sem tinta ou inspiração que sejam só o que são complexos seres viventes. Eu, artesã da palavra que nasce não sei onde que voa não sei por quê. Eu, dependente completa da folha em branco do desejo de dizer. Eu, árvore seca de serrado a menor das mulheres solitária e vazia, solta no prado que verte verbos aos milhares que busca o ainda não dito que sopra o nunca sentido. Eu, nua e exausta comum entre os comuns comum entre os outros comum entre o espelho e eu. Atravesso portas umbrais cortados pelas brasas das canetas apertadas entre os dedos de poetas que se recusam a ficar surdos aos apelos da alma, da vida, do coração. Aos 56 minutos do dia 23.05.2008

Prata da casa

Os escritos se sucedem sem ligação alguma entre eles são surtos de movimentos nas linhas fixas da agenda riscada de silêncios e pontos de contorno das vias externas do dorso das mãos que escrevem letras azuladas pra serem lidas por ninguém... 22.05.2008 - 23h29min