segunda-feira, 28 de setembro de 2009
Emocionar-se
Gosto das letras que emocionam
gosto de não poder conter as lágrimas
essas gotinhas insistentes
que aparecem sem licença
e despudoradamente assumem
o comando dos nossos olhos
pra não falar do coração...
Gosto mesmo quando as tais gotinhas
chegam a existir sem aparecer
- quantos outros sentires guardamos
que jamais aparecerão aos outros? -
mas inundam o peito de tal maneira
que é como se tivéssemos chorado
a vida inteira. Exagero?
Qual nada! É assim que deve ser
a emoção verdadeira.
Aquela coisinha miúda
que não desgruda
que é eterna
e que tanto bem faz à gente.
Experimente....
28.09.09 - 21h40min
Poetar
Quando a poesia te corre nas veias
basta uma vírgula
um riso
um sal nos olhos
um colírio qualquer
uma flor
uma frase
uma alegria mínima
uma tristeza mínima
uma agonia mínima;
basta uma cor de sangue
ou um sangue azul
talvez só o tipo do teu sangue;
talvez só um nervosismo repente
ou um repentino aperto de mãos
ou uma partida num repente
ou um repartido aparente,
pra fazer verter essa coisa
que não se explica
mas que te habita
e te domina
e te toma num instante
sem licença ou aviso:
in-verso...
28.09.09 - 02h13min
Imagem
Um sopro de lua
estrelou-me a pele de arrepios
derreteu-me os suores noturnos
desenhou-me a dança
no ventre da noite.
Nas pontas dos pés
o sono não veio.
Nas pontas dos pés
Morpheu insone
foi meu par ...
28.09.09 - 02h04min
Insolente insônia
Não dormir hoje
é quase como impedir
que a manhã rompa a noite
e outro dia comece tudo de novo.
Não dormir hoje
é iludir-se que o hoje não termine
de puro medo do que amanhã haverá.
Amanhã não guarda
nada além de mistérios
e são eles que afogam os delírios
são eles que fazem tudo se transformar
em possíveis eventos
em passíveis eventos
em plausíveis eventos
inventos
intentos
insultos.
Amanhã torna tudo palpável
ao virar hoje
e matar o hoje
que se perdeu;
com ele, tudo o que foi meu.
Amanhã mitifica hoje
pinta de um colorido inexistente
- e é tão pouco provável o inatingível -.
Não dormir hoje
é perpetuar a hora.
Ou não...
01h58min - 28.09.09
Desconcerto
Não preciso de permissão pra sonhar
nem ele precisa da minha, pra invadir-me as noites;
ele, o sonho, esse monstro diuturno
esse monte cancioneiro.
Provoco ondas na relva
pranteio curvas na relva
pressinto ossos na relva.
Vendaval assusta os cães raivosos
arranca os telhados das luas
despenteia as melenas dos leões
prepara a travessia
d'outra noite insone
povoada de vícios
e tramelas nas janelas velhas.
Caminho aberto
nem sempre é certo
nem sempre é seguro.
Muitas vezes, melhor lavar a roupa
antes de despudorar-se no banho de chuva fria
escorrida das cordas do violão desafinado
que jamais aprendi a cantar...
Desatino
desconcerto
sonho
ou
loucura?
28.09.09 - 01h20min
Tempero
Hei de arredondar as arestas
do poço seco da garganta vazia
como nascem todas as estrelas
nas noites de inverno ou de verão
ou de perfumada primavera
sem vigílias ou restos ou desconhecidos rostos
nos panos rotos das cortinas
levadas pelos ventos tortos
que balançam meus cabelos encaracolados de revoltas
e reviravoltas
entre teus dedos de lua e vertigem ardida.
Pimenta e sal.
Aos 59 minutos do dia 28.09.09
Entre a palavra e o silêncio
Tem vezes que só o que eu quero é calar.
Não brota de mim um único verso;
sequer um verso amargo.
Nada.
Nenhuma frase que se aproveite.
Nenhuma palavra que provoque outras ao grito.
Nenhum desejo de dizer.
O silêncio, então, é meu companheiro,
e mergulha comigo numa mudez severa,
quase doída,
completamente doida,
daquela doideira
que os outros consideram normalidade.
Porque a minha palavra é louca.
E quando ela cala,
eu até pareço igual aos que me cercam:
o orvalho me molha,
a chuva me molha,
o suor me molha.
Quando ela fala
eu sou outra,
eu não existo:
a água me adormece,
o calor me atiça,
o tiro me aviva.
Quando a palavra me fala,
sou qualquer coisa que triunfa,
n'algum ponto que ninguém desvenda,
porque não encontra,
e não encontra porque está perdido
entre as folhas amareladas
do livro da minha vida torta.
A mesma vida que de vez em quando
se dá o direito de calar,
e,
por instantes,
se acreditar parte d'algo maior,
té que a torrente de vocábulos
exploda de novo
destrua o dique
e me obrigue a abraçar
minha assumida sina:
a solidão completa...
Aos 49 minutos do dia 28.09.09
Volta
Volto assim, meio sonolenta
meio dispersa
meio confusa
como desnorteados são meus dias
e meus pensamentos de versos difusos.
Volto assim, meio extremada
que não sou mulher de meios:
meias palavras
meias usuras
meias entregas
nunca.
Volto assim, meio desconfiada
e afio as facas sem gumes
nos lumes das estrelas vagas.
Volto assim, meio voraz
de bênçãos
de beijos
de balanços gerais.
Volto aos poucos
pra chegar inteira
e preferir ficar.
Volto...
Aos 37 minutos do dia 28.09.2009
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