sexta-feira, 17 de julho de 2009
Silenciosamente
Salvo as palavras que eu não disse
por absoluta impossibilidade de cuspir
cada vírgula do completo absurdo.
Deito curativos sobre as feridas abertas
e procuro o cisco do olho
caído n'alguma fresta da mesa
ou n'algum resto de orvalho
pendurado no orgulho da aurora
que pinga desses meus olhos castanhos.
A rima perdida no abuso
da saliva engolida sem língua
sem vocábulo certo.
A trova trocada a custo
e o trem que não apita
menos por não encontrar a estação
que por estar rouco de loucura
sem gana de luta
nem motivo de razão.
Silenciosamente
recolho-me à rua da amargura
que fecha a garganta
e mata o ar que não passa.
Mergulho nas sombras
e peço arrego.
Por vencida, dou-me.
Dôo meu medo.
Dôo quem deixei de ser.
Silenciosamente...
17.07.2009 - 17h
Tempo XXI
Estão extintas as horas exatas.
Só vejo os quebrados nos ponteiros tortos
dos relógios parados
que carrego ao pescoço
tiquetaqueando as sombras
que acompanham a passagem
vai saber de quem.
Penduricalhos inúteis,
os minutos são os limites do meu susto.
Cada quarto de hora
é um quarto de honra vazio
é um quarto de queijo prato
é um quarto de lua crescente minguante cheia.
Cada segundo é o primeiro espaço
na tela de contas entrelaçadas
que eu não sei resolver.
Quebro o vidro do tempo
que passa sem me avisar
nem me mostrar o porque.
Adianto o relógio
atraso a vida
tranco a medida exata
que eu não sei precisar
nem vou aprender.
E me dou por satisfeita.
Mais um dia.
Ascender?
17.07.2009 - 16h
Pacto
Compactuo com as luzes
que extraio das pontas dos dedos
por detrás da janela fechada
que não abri hoje
nem sei se vou abrir.
Enrolo o cachecol da loucura
na ponta doce de uma mentira
que me convenceu a permanecer
onde eu de fato nunca saí.
Corto os pulsos do umbigo
e não me desculpo
por me saber importante
e terminantemente insubstituível.
(Todos o somos?)
Sei das minhas forças mortas
e as portas das celas trancadas
amortecidas na cadeira
que me acomete de falhas
e de cruéis dúvidas escuras.
Assumo meus sonhos
como quem se diverte
co'a desgraça alheia
e acometo-me de fantasmas
que colaboram com minhas escolhas
como quem domina as metas
e desenha os finais.
Não sei honrar os buracos
que arrombam minha estrada perfeita.
Não sei alencar poeiras
que assombram minha pedra estreita.
Não sei assaltar saliências
que entortam minha vida aceita.
Mas sei o quanto posso,
sei o que possuo,
tudo o que disfarço.
Sei o que encontro
e o que perco entre as penas
dos discutidos dias passados.
Sei desse meu desencanto
que aumenta a unidade vazia
do meu telhado de vidro trincado
que eu insisto em não trocar.
Meu pacto é comigo mesma.
Egoísta eu
minha escolha
vida minha.
Se não fora assim,
assim seria.
17.07.2009 - 15h33min
Limite
Vivo na ponta da faca.
Equilibro as pedras do caminho
pra chutar meus entulhos
e minhas vertentes todas
como se fora música
aos ouvidos de uma chuva
quieta de granizo liso azul.
Maria não sou,
não sou bendita,
nem santa,
às vezes prostituta.
Converso com o fio da espada
e engulo o fel que extraio
de minhas próprias arestas abertas.
Não sou Maria,
bendita não sou,
santa sequer,
prostipura, às vezes.
E se rasgo a roupa da lua
no intento de cumprir meu fado,
estouro os miolos da fibra
que abracei sem medo,
na luta desigual diária
que travo comigo mesma
e que perco, sempre.
Maria bendita santa
prostituta pura, às vezes
outras vezes, nem tanto.
Sempre azul.
17.07.2009 - 14h37min
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