segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Desassossego


*Para TI



Há que se ter boa dose de candura
quando não balançam os galhos das árvores
nem sopra a brisa matutina no bico das aves.
Há que se ter um sabor de chocolate
meio amargo, meio hortelanizado,
enfeite de parede na sala
chave de espera trancada.
Há que se ter um permeio, quase afinidade
por essas coisas simples
do cotidiano de qualquer um:
o balde, o pano, a xícara, o irmão,
o paralelepípedo, a churrasqueira, o sabão,
tudo farinha do mesmo saco de açúcar
que adoça hoje o que virá amanhã.
Há que se ter paciência e pé ligeiro
que os cansados sempre se estressam
e os dispostos sempre se apressam
em dizer das flores e dos versos
e colher relâmpagos e acertos.
Quebram-se, eles: as pernas das mesas,
os pneus das bicicletas, as asas dos aviões,
mas não desistem nem se exasperam
posto terem por princípio
a teimosia e as competições.
Vencem, depois de tudo,
e, num repente, num que sem razão,
correm de novo
à procura d'outro ponto
querendo pura e simplesmente
mais um pedaço conquistado de chão.






31.01.11 - 14h


sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Aflitivo

Manipulo a linha da folha
com rodas de letras
e pontas de espinhos
minhas rendas
meus botões
minha vida.
Ansiedade não ter tinta
praticar o imperfeito
sacudir o pó da lua
nas palmas das mãos.
Luz azul na entrada e no conceito
premissa de extremos opostos
soluções conquistadas.

O poema escorre da janela...









28.01.11 - 02h

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Explícito

Pesco intenções
a isca depende do peso
do peixe que arrasto
no aquário mundano.




Um poeta ao piano
é uma nota suspensa
perdidamente ecoada
nos cheiros de livros
da biblioteca fechada
nas mãos uma tinta
e todos os versos do mundo
nadando imprevistos
improvisados sentidos
brinde entre amigos
parte-se a partitura
os mensageiros deliram
deliberam as moscas
e os acordes soam sujos
nem por isso menos ausentes
bêbados transeuntes
o chamado que não veio
a veia azul do príncipe
aventura e entretenimento
na saliva que escorre
da boca artista
na boca devassa
fios de vida ardente...






26.01.11 - 17h

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Promiscuidade





Farelos soltos
de cartas ao vento.

As estatísticas andam contra
as estátuas expostas.

Mancam os incertos
números de utilidade barata.

Depois da esquina, a espinha ereta.




Incêndios são fumaças
de longe vistas
nem sempre dispersas a tempo.

Na pasta, a imprecisão brilha
diamante bruto
em cesto de vime farpado.




Já não bastam sinais, amiúde.

Há que se estender ao mundo
a ideia guardada.

Girar as sete chaves da felicidade
feito sinos cantantes, às portas
sempre que escancaradas.

Distribuir sorrisos e feitos.

Enfeitiçar, deveras.

E suspender o uso.

Assim, num repente,
sem deixar sequelas.










Promiscuidar-se.








25.01.11 - 15h02min

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Dançarina

Bailarina de perna quebrada
sem orquestra sinfônica
sem arco doirado
ou sapatilha de ponta
que faça deslizar
- pena cheia de tinta -
na folha do palco, vazia.

Desligados os ouvidos
dos rumores da terra.

A Terra não gira; balança
ziguezagueia
nas pupilas da vida.

Faltam palavras que dançam
já que o  universo desertou da luta.

Rolam cabeças de porongo
e os contos escolhidos
encantonados,
se rompem.






Na folha do palco
no meio da carta vazia
o lago do cisne passeia
p
a
r
a
l
i
s
a
n
t
e
.
.
.















24.01.11 - 15h25min


Arcus tensus saepius rompitur*

Traço metas bem definidas
em estapafúrdias prateleiras vazias.
Zombo do obstáculo
que se considera concluso.
Ao invés de sete, pinto meios fios ondulantes
que negam minha Matemática
já tão nula.
Os óculos vencidos atrasam as letras
e os problemas pingam intermitentes
na ponta da língua:
velhas fotografias, impedidas de se fazer.
Mergulho de cabeça no basalto
e nao quebro nada além da pedra
ela mesma, que pratica o desapego.
Deliberadamente construo o muro
tijolo a tijolo, sem medo,
cimentado com vontade dura
inquebrável
intransponível.


Alguns abismos exigem a incondicional ausência de pontes...






24.11.01 - 15h05min
*Corda puxada se quebra

domingo, 23 de janeiro de 2011

Fac simile

Não comento o espelho fosco
que mal reflete a imagem assistida.
Apago a chama recém adquirida
e pingo uma gota de orvalho
no paletó amassado da madrugada.
São fantasmas e delírios
brigando por um espaço no facho de luz
que se precipita nos olhos apagados
da luta imperfeita de toda uma vida.


Os cacos de hotel, os princípios permitidos
os aéreos anos de doirados sonhos
insuspeitos de trilhas e pedaços de algodão partidos
particípios de um passado oculto na fibra.


Formação de quadrilha
furacão de partilha
fundação de quinquilharia.


Formas de vida que abalam
a estrutura do poema recém escrito.


NÃO AFUNDE!
Gritam-me gargantas mudas.
Apressam-se botes salva-vidas.
Erguem-se cortinas.
Falham alaúdes.


NÃO AFUNDE!
Gritam-me.






Queimo.











 


23.01.11 - 03h02min

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Pantomima

Recolho-me à minha insignificante coleção de frases cantadas
como se delas extraísse o mel do sono
pra pintar de verde o dia que já nasce.

Vou pela sombra
fatigada de fagulhas coloridas
como quem tem medo do pesadelo que se sabe à espreita
no ponteiro do relógio que não bate.


Diminuta expectativa
de exigências postas à mesa
misturadas à janta fria
carregadas de debate.
Polêmicas dissecadas a esmo
assuntos pendentes presos aos artelhos
cartadas nos dentes de sabre
sabedorias populares `a frente.
Soldados armados de telhas quebradas
folias de reis e rainhas rasgados
fora dos trilhos dos trens
e dos apitos, de longe trilados.

Tempo de silenciosa melodia
composição de estrelas e fundos improváveis.
A pretensão de ser eterna
abandona a linha aberta.

Introdução.

Caligrafia.




20.01.11 - 03h50min

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Incompletude

A fibra tropeça no muro
força a costura na prática
alinhava a próxima esteira.

Viver exige esforço prematuro
e sangue quente
de guerreiro.




18.01.11 - 01h56min

Des-canso

Viro a noite
que segue um dia
de cabeça pra baixo.
Depois do sono indeciso
que veio à revelia
e instalou-se sem pressa
entre os cobertores dobrados
na ponta da poltrona
do último dos quatro cantos da vida,
um fio de esperança pousa
no começo do sonho desfiado.
Não sei com que trauma
as frestas dos minutos convivem
pra não exaurir de forças
os movimentos que se obrigam
a despertar
quando dormindo deveriam.
O corpo suporta.
Té quando?







18.01.11 - 01h40min

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Produto final

Tem gente que me preocupa
gente que me provoca
gente que me enche
gente que me interessa
gente que me desperta
gente que me intriga...

Tem gente que me conhece
gente que me odeia
gente que me enternece
gente que me incendeia
gente que me faz e me desorienta...

Tem gente que me pensa gente
mas erra
porque
longe de ser gente
sou letra
que vaza
do canto da boca do louco
que um dia
alguém inventou de chamar de

Poeta...





17.01.11 - 04h25min

domingo, 16 de janeiro de 2011

Escultura




E se na concha das mãos
uma vida sussurra à parte,
participante d'outras entranhas
é essa minha liberdade


que voa e



mundos escritos planeja
na folha seca




que parte...






16.01.11 - 16h37min
*Fotografia: Obra de Ricardo Kersting

Sucinta

Sem surpresas, os pedaços da vida
seriam estéreis.











16.01.11 - 15h 21min

Expressão

"Tem uma listra rosa, nas nuvens..." (Alina Aver)





Engulo em seco
o instante úmido.
A existência é qualquer coisa
que me perturba.
A bússola que me alia ao eixo
aponta um acontecido
que me limita
às paredes de um certo fim de semana.

Escalo instantâneas lembranças
que cuidadosamente escolho
num céu de azul anil
pontilhado de brancos carneirinhos d'água.
Coçam-me as pontas dos dedos
querendo dizer impertinências
depois dos três pontos de mim.

E eu já nem sei a quantas ando
no redemoinho de tão ligeiras paisagens.

O dia nasceu fervente.



16.01.11 - 15h 02min

sábado, 15 de janeiro de 2011

Meus dez anos

Saudade de tudo da minha infância
do cheiro de pneu de bicicleta
do churrasco no bosque, aos domingos
das bonecas de pano, da casa cheia.

Saudade do que não volta
nem por fotografia
da Maria Fumaça
do balanço na árvore
das brincadeiras de roda
dos problemas insolúveis
que, de problemas, nada tinham.

Saudade da inocência tida
alheia a afogamentos
deslizamentos
entulhos políticos.

Saudade da verdadeira poesia...





15.01.11 - 16h28min

Prudência

Cordata,
aceito a existência de mentiras
como se natural fosse
estar há dias sem um prato de comida.
Engano aos vendidos minutos:
nada importa
pouco vale o silêncio obtuso,
um grama de poesia
minha fome de permuta
já sacia.
Casta,
evito escândalos
escavo túneis
delineio metas
que excluem...

o benefício é meu
se a porta estiver aberta... 






15.01.11 - 15h 26min

Essência

Esmeralda é pedra espalmada
no extremo oposto da noite
em que meus olhos
relutantes de aceitar a morte
permanecem abertos
atentos ao próximo gênese.
Horizontalmente
doo a cartada final do embate
quando as luzes já não bastam
e os pesadelos cercam as janelas e
os botões acesos dos aparelhos
desligados das tomadas de força
formados de cinzas e cantoneiras brancas.
Não me importa a coerência rara
na alta madrugada
em que me encontro
- eu e os meus fantasmas todos -
frutos de entremeios
que me eximem da culpa
de não dormir.
Esse desejo impoluto
de saciar-me de vida e mistério
ondas de lacrimejantes febres
manifesto de energia em mim
é que rascunha meus próximos versos
os ritmos que me permito
os laços que abro e sustento e vibro.

Raiz dessa minha controvérsia essencial...




15.01.11 - 14h 03min

Enigma

Augusto dos Anjos
de asas quebradas
nas teias
cuidadosamente esticadas:
presa perfeita
de versos
que denunciaram
os limites desnecessários
para o voo alçar...





15.01.11 - 05h28min

Confessionário

E se os anjos disserem amém
bem na hora de um desejo maligno?
Valham-me os deuses!
Que diriam meus pares
se soubessem o quanto de mim há
nos pecados que não ouso confessar?





15.01.11 - 05h12min

Insônia

Busco nas sombras da noite
na luz da tela vazia
a réstia de sono
que eu não tinha
té as horas escorrerem
goela abaixo
da gola da lua
e se perderem
n'algum ponto obscuro.

Minha função é alimentar
os fios de velas
do que se pretende real
mas que pinga no papel
desenhado de sonho
- espetáculo banal -.

Nutro a essência da poesia
na insana despedida
de quem não ousa apresentar
qualquer argumento que valha
um terço da sentença finita
que eu pedi pra demonstrar.

Acompanho o tilintar dos trincos
na passagem de todos os segundos
recolhem-se os mundos
os gênios despedem as lâmpadas



e eu




busco nas sombras da noite
na luz da tela vazia
um despertar que me invente
um jeito de ser diferente
o milagre de apagar-me o dia...





15.01.11 - 05h06min
Quase manhã...

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Indiscutível gosto

Gosto de saber
tua saliva a molhar-me as palavras
teus braços a dizer-me o dia
teus frutos a encantar-me presença.

Gosto de açucarar bandejas
estrelar teus feitos
enfeitar teus laços
teus encontros entre linhas
tua pele à flor dos nervos.

Gosto de notificar-te espelho
satisfazer-te os desejos
enlouquecer-te os juízos.

Enfim
de tudo o que te acende
o que mais gosto
é de mim mesma...




14.01.11 - 22h27min

Ininterrupto

Componho canções abstratas
do que suponho indispensável
aos dizeres das grutas
fechadas para balanço
nos fins de semana
das primeiras impressões
largadas nas calçadas encardidas
dos caminhos mil vezes trilhados
e outras mil abatidos
por fendas e decotes desconhecidos.

Aliso as madeixas
remexo nos bolsos vazios
procurando moedas de papel
e bilhetes rasgados de tempos idos.

Nada resta além da dedicatória
escrita às pressas
depois da exigência
depois de ontem
quando as esperanças foram outras
e os futuros se sabiam
obsoletos.

Ainda assim...


... a vida segue...



14.01.11 - 21h33min

Desculpas

E se alguma poetagem nova
me trouxe ao mundo desvirtuado
de tranças e sancas de lâmpadas verdes,

se algum pesadelo perdido
enrolou-se nos galhos da vida
de tantos solstícios amanhecida,

se algum pretexto eu tive
de longa efemeridade amanteigada
nas minhas próprias contradições absolutas,

se alaúdes me dançam
e perpetuam minhas sombras
nas madrugadas macias
de fantásticas conversas tantas
pautadas em descarriladas promessas
de aldeões mudos e tesos,

é que me sobram horas
de desenfreada criação
do que desiste de estar
na existência paralela
dessas minhas juntas

é que me doem os dedos
no grito por despejar d'alma
verbais artelhos

é que me assombram atavios
de vírgulas, agulhas e exclamações
que não diriam d'outros feitos
não fossem os meus olhos
secos de fantasmas
curtos de avisos
fartos

de expressão mútua.






14.01.11 - 19h32min

Transbordar-me

Listo as próximas ações
como quem sabe o que faz.

A mulher que me devora as entranhas
luta contra delírios escolhidos
nos quatro cantos dos meus círculos
esvaziados de crenças pagãs.

Licencio as próximas explosões
como quem se delicia.

A mulher que se derrama dos meus membros
ao diabo uma vela acende
aos homens oferece incêndios
descabidos de proporções homéricas.

Silencio as próximas explorações
como quem se digladia.

Lânguida,
transbordo-me...





14.01.11 - 18h23min

Aço

Teu dedo em riste
não pisca meus cílios
no vento fresco de ontem
que hoje engoliu o medo
de não saber dizer.
Sou coragem e valentia
no passo já dado
no próximo dia
qu'inda não apaguei
pra ver.
Não voei sem as asas
do oceano distante
que não nada meus tudos
nem planeja ombros juntos
justos versos errantes
que me amontoam
e liberam os elos
que os entrelaces
desfizeram.
Rio das circunstâncias
afogo nas águas das chuvas
os choques dos transeuntes.
Sou dimensão etérea
nas moléculas das metáforas
que inexistem sem mim.

Gesto impreciso
de descrever luas
e desenhar lombos duros...






14.01.11 - 17h57min

Montanha russa

O aderir das caldeiras
informa canções de outrora
embebidas de imaculadas autorias
mensagens urgentes de reflexos

que a gente não sabia
nem poderia saber.

Os armazéns guardam relíquias
de lembranças compradas com sangue
e susto amanhecido
pórticos de estrelas
e pontos estratégicos que não se leem
nem se transcrevem, deveras.

Para além dos mundos conhecidos
situamos insuficientes declarações
adivinhamos pedaços de segundos

que a gente não sabia
nem poderia saber.

Solto o cabresto
a queda é suspeita de crime
não-concluso.
A arma branca mora na língua

que a gente não sabia
nem poderia saber.

Mas dissemos
em alto e bom som
alardeamos a promiscuidade
de nossos sonhos
subimos ao alto dos morros mais altos
pra vertiginosamente
descer

e a gente não vivia
nem poderia morrer...





14.01.11 - 17h32min

Oráculo

O dicionário planta a ideia do novo espaço
trancafia os vocábulos mancos
nas páginas fechadas
da tua boca macia.

A barba por fazer
dos versos quebrados
no começo do que não houve
devido à geografia
planta um sabor de anis
aos irregulares plurais exatos
do que não dispomos
em monossilábicas vozes.

Aberta a porta da cozinha
tocam-se as pronúncias fechadas
das vogais repetidas por sopros
e difíceis conjugações carnais.

Somos verbos ambulantes
sintomas de símbolos errantes
sinetes de locuções adverbiais.

Nossos resumos nos prendem ao mesmo.

Nossos tremores nos consultam
e não facilitam as trocas
ao contrário
reforçam as fechaduras
disfarçam os deslizes
e permanecem nos sempre grupos.

Os roteiros em que nossos passos desligam
os casuais tropeços que nos causam giros
de mais de trezentos e sessenta graus
separam o que chamamos de correntes
do que queremos dos tórridos experimentos
que nos cercam
sem sossego nos dar.

A safra d'outro delírio
aguarda a colheita...



14.01.11 - 16h43min 


Desígnio

O plano era salvar o fio da espada
da cegueira total
enquanto os arcos do universo
uivavam luas e trilhos de cortinas
esvoaçantes de rasgos doirados de sal.

O plano era surtir o efeito contrário
nas telas sagradas de quadros antigos
pintados por magos e delirantes vazios
contrastes de drásticos limites
encovados nas energias d'outras mãos.

O plano era manter-se longe dos pecados
comuns aos fabulosos devassos
germinados nos ícones da rua apagada e crua
onde insuspeitas culpas latejam
e devoram o pouco da exatidão tida
ao longo das esferas celestes
jamais alcançadas ou conhecidas.

O plano era andar ao largo
ser nômade e odalisca
nas noites frias, nos exaustos dias
em que perpendiculares nuvens
trancam algodões maciços
de restos de lã de vida.

Permutar sabores
pincelar formas
pontilhar linhas
sobre os planos tidos
perdidos
n'alguma volta do caminho
quando o mais torpe desejo
foi o de arrancar-te o peito
e dele fazer-me um berço.







14.01.11 - 15h36min

Caminho

De todas as trilhas abertas
sons de mensagens perdidas
assuntos crispados nas pedras
perdas acompanhadas de acintes
a melhor visão de ontem
é a canção de risos
nos espelhos intactos da vida
os tapetes de noites mal dormidas
insônias por bons começos
impertinências na boca do tempo
que passa
que passa
que passa.





14.01.11 - 14h18min

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Salvador

Ponto único no espaço
vazio de palavras.

Perfume natural de dia ensolarado
em que as demências viram suor
e os delírios, preces de monges cegos
nas curvas de picadas abertas à mão.
Desdenho o próximo verso.
Aproximo o desenho do verbo
feito quem planta o surreal.
Dali visita meus cabelos
nas pontas dos pincéis gastos
dos relógios derretidos de amanhã.
Dispenso as horas e os horrores.

Ponto espasmódico da palavra
vazia de unidade...



11.01.11 - 15h58min

Outra lenha

Janelas abertas
paisagens pouco palpáveis
palatáveis episódios brancos
de estruturas questionáveis
e outras tantas ilusórias vertigens.
Vestígios de pedaços transpostos
nos rasgos de estrelas distantes.
Buscas insuficientes.
Pontos interrogativos no grão de sal da morte.





11.01.11 - 15h08min

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Gota

Suspeito da faceta primária.
Que raio de agouro é esse
que extermina a possibilidade
de construir outro caminho?
Angario fundas e feixes de nervos
nas mãos em concha
de poderosos imãs
e religiões pagãs.
Confundo sátiros e monges
descontentes com as marchas
e trelas que dou de bandeja
a este ou aquele visitante torto.
Entorno o leite de reserva.
A última gota:
oferenda ao deus cego
que me amarrou dentro da letra
do teu único nome
 O.


O ponto final
de um gigante
absorto nos próprios pensamentos.








06.01.11 - 23h15min



Beberagem

Esse início de noite pintou-se de poesia
co'a chuva.
Céu amarelado de um lado
roxo d'outro
como se possível fosse um bêbado
no firmamento.
Ah não!
Esse bêbado não traja luto.
Nada traz nos andrajos
que desfila aos saltos
entre uma e outra nuvem esfarelada
que pinga.
Mardita pinga
braba
marcada de fuligem
da nuvem esguia
que tenta disfarçar
o cambaleio devasso
nos céus do meu dia.
Melhor dizendo
do fim deste meu dia.
Trocando as pernas
e os passos trôpegos
carentes de firmeza
e perspectivas brancas.
 
Escreve.
Mardito pingo de caneta
embriagada letra travestida de "erre"
onde o "ele" já não vinga.
"Ele" ou ele?
Bebe, pr'esquecer a esquina.
A quina da mesa
na perna recolhida.
Pena no ar.
Ele.
 
 
 
 
06.01.11 - 23h07min