domingo, 7 de setembro de 2008

Sem a letra

A letra desapareceu
perdida nas tralhas da vida
escorregada nos limos
das discordâncias várias
a letra sumiu
ninguém sabe
ninguém viu.
Inconformados os poetas
os literatos
os críticos
os incrédulos
não rimam
com diários
nem com nada
mais.
Nada que combine
a sílaba no espaço.
Nada que culmine
em beleza.
Nenhum ritmo
suficiente.
Nenhum laço.
Nenhum lapso.
Nenhum impertinente
pensamento.
Nenhuma orientação.
Não há Norte.
Não há morte.
Não há confusão.
Tudo na mais perfeita paz.
Harmonia artificial
sem a letra.
Sem a canção da voz.
Não há motivo
nem solução.
Hoje o sol não nasceu.
Hoje não se estendeu a mão.
Hoje falta o sentido
o significado
a razão.
A letra não apareceu.
Não houve chance de pedir perdão...
07.09.2008 - 23h58min

A esmo...

A esmo, esmoreço.
Estremeço
na estreita estrada.
Escadaria.
Ensurdeço na espera
insalubre.
Amanheço
sem querer.
Sem querer
me nutro
de ausências.
Escuto.
Nenhum ser
absoluto.
Necessidade
absurda.
Absorvo
o luto.
Entardeço.
Sou crepúsculo.
Esmoreço...
07.09.2008 - 23h40min

Banho de chuva

07.09.2008 - 17h
*Da série: Mulheres sem rosto

Mar

Ah, eu queria escrever-te um poema. Descrever tuas ondas que derrubam minhas resistências. Todas as minhas reticências. Eu queria escrever-te uma canção, que cantasse teus encantos enfeitiçasse qual canto de sereia, na alma de quem ouvisse: invasão. Mas a inversão de valores te trouxe pra praia, fez de ti um homem grande, forte, viril, sedento de mim sedento de ti mesmo e desses teus versos que acompanham o vir e ir das tuas ondas. Essas ondas que derrubam minhas resistências. Essas tuas ondas que desembarcam e desesperam meus obstáculos. Os obstáculos que insisto em erguer pra impedir teu avanço. Essas ondas que apagam minhas interrogações e molham minhas pernas bambas. Essas tuas ondas que acentuam minha dança quando explodem na praia, ensurdecedor marulho. Ensandecido murmúrio aos meus ouvidos sonolentos no início da manhã-surpresa em que me despertas marejando-me os olhos marcados pelas tuas íris castanhas. Meu Mar particular. Eu, tua areia úmida. Queria escrever-te um poema. Não consegui. Porque só sei te aMAR. Aos 45 minutos do dia 07.09.2008

Tom

Eu quero o tom
o tom da lua
o teor da luz neon.
Eu quero o tom
da voz. Da voz madura
que se profere nas ruas
e prefere a circunstância
à cicatriz.
Eu quero o tom de azul
na minha lente
na minha camisa
na minha estante
de livros virtuais
que inda não li.
Eu quero o tom da tua
língua diferente da minha
a me dizer o que não sei
o que não aprendi.
Eu quero o tom da descoberta
do incerto, do impreciso, do indiscreto.
Eu quero o tom do que escolhi
entre tantas escolhas mal feitas
fadadas ao fracasso total,
eu quero o tom das que temi
porque tinham chance
de vingar, afinal.
Eu quero o tom da linha
de costura da minha mãe.
Eu quero o tom do saxofone
que ouvi distante,
na Praia Vermelha,
há anos atrás.
Eu quero o tom que não tive
o tom que ainda terei
o tom do dom lilás
do sorriso
que
te
dei...
07.09.2008 - 0h16min