sábado, 30 de julho de 2011

O eterno retorno

(A Persistência Da Memória - Salvador Dali)



Todos os tempos são simultâneos
o futuro se desenrola
nesse exato instante
em que a pena fere a folha branca
na conjunção de um agora com um ontem.
Está tudo aqui, nesse mesmo momento
minha morte, meu nascimento
as escolhas que não fiz
e todos os meus tormentos.
O eterno retorno de Nietzsche
volta sempre para o mesmo lugar
d'onde jamais partira-e-irá.

Todos os tempos
simultaneamente
num mesmo lugar...






30.07.2011 - 13h32min

Liso

Escorrego e quebro a'lma
no ponto exato em que as pernas bambas
exigem direção curta.
Peso e tragédia são muros
de escovas e pinhas
nos galhos das horas
que passam.

Impossível engessar a alma
improvável alcançar a cura.

Resta-me uma ponta intacta
regenerativa...

Pulso.




30.07.2011 - 02h09min

Desabafo



Viajo na garganta seca
arranco meu sonho das nuvens
e planto sementes no inferno
onde o fogo suporta-me as crises.

Com força, sigo a linha estreita
dos costumes questionáveis
e das insensatas lutas.

Não abandono meus medos
nem eles desgrudam de mim.

Minha mente sua sangue
desestrutura a simplicidade
complica qualquer instante.

Arrebato restos de salivas
desperdiçadas entre dentes.

Rasgo a ferida.
Aceito o dia.
Permaneço
nua.

Em mim.



Na primeira hora e 37 minutos, do dia 30.07.2011

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Clareza




Arrasto minhas correntes
afundo os pés na terra
e sinto a dureza do chão
a pedra na janela
acertou-me a testa
sem culpa de ninguém
além da minha própria lama.

Eu
comigo.

Minh'alma descalça
descansa nos arredores do juízo
completamente perturbada.
Raspo os pensamentos
e as intenções que tive
descarto.
Recolho-me aos meus limites
que às vezes esqueço
que às vezes perco de vista
mas finco as estacas com força
té que outro vento me cegue.

Por enquanto me protejo.

Eu
comigo.





29.07.2011 - 23h38min

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Descrição

Eu gosto de dias claros
e roupas com cheiro de Sol
de luz natural
de primavera em flor.
Eu gosto de riso espontâneo
e de lágrima de emoção.
De campo, mato e cidade grande
cada um com seu encanto, lamento e confusão.
Eu gosto de dormir de conchinha
e de banho de mangueira na praia,
chantilly, gelo seco, manta uruguaia.
Eu gosto de fruta madura, toque de sino e sinal de fumaça.
Eu gosto de Tai Chi, arroz com feijão e mudança,
elevadores, cavalos e cães sem raça,
pinhão, batata doce e mel
e de estrelas coloridas, bordando o céu.
Eu gosto de quem acredita
de quem tem coragem
de quem segue a verdade
ainda que diferente da minha.
Eu gosto de gente bem resolvida
de quem não mente a idade
de experimentos gastronômicos e Arte.
Eu gosto de gente tímida
e de gente ousada
- mas só se for além da conta.
Eu tenho pena dos desesperados
e raiva dos injustos.
Eu fujo dos fracos e atraio bêbados.
Eu creio na infinitude
e gosto de acordar tarde.
Eu amo viagens
e vagens e fuligens.

Eu sou todas as miragens...



27.07.2011 - 12h03min

terça-feira, 26 de julho de 2011

Espólio

Minha poesia é espinho
cravado na minha pele clara
o sangue escorrido tinge a folha
e sobre ele desenho palavras.
Assim me doo
assim me doem as letras
a ferro e fogo arrancadas
a fórceps
no parto das madrugadas.




Minha poesia não tem a beleza da rima
cuidadosamente esfarinhada
pincelada a ouro
e dedilhada em violão afinado.
Não.
É manca a minha estrofe.
Coroa de pontiagudas foices
machucada de algodão
e grita
entre os dentes da caneta
grita
na face do papel
grita.

Minha poesia espezinha tudo
a rima
a métrica
o jugo
de ter perfeito ritmo
e coisa e tal.

E finca a faca
no olho maldito
que exige clemência
sem dar nó na garganta da lua
que brinca de clichês
e outros ques notórios
enquanto de mim
não é verbo que nasce
mas vida que escorre
vermelha de medo e vergonha
de tanto ser pequena
na'scuridão da noite fria.

Minha poesia é putrefato despojo.

Sobre o túmulo dela
uma lápide vazia.

Nada havia
a dizer
nada via...



26.07.2011 - 04h34min

Bah noite

Recolho-me à minha insignificância.
Versos travesseiram-me.
Atravessam as 4 horas que se esvaem em pedaços de vírgulas nos instantes.
Vou pela sombra.
Refaço o caminho da vinda.
A vinha afoga o lenço arrastado.
O sonho que não enraizou-se.
O lance de escada que não deu o primeiro passo
o primeiro invento
o primeiro pedaço de luz.

(Caco de espelho)

Que não deu a trégua que eu precisava.



Voo.




26.07.2011 - 04h12min

Embuste

Indago se me basta
um hoje raso.

Voos interrompidos
buscas com dia e hora
pra despedir os aplausos.

O vale reflete meus desejos e o Sol aquece o grão da uva inda nem nascida.

São longas as madrugadas em que vejo escoar-se de mim o que não houve.

Indago se me soa suficiente
um hoje exausto.

Fatos insistidos
bruscas linhas e honras
pra alimentar os instintos.

Os vãos engolem meus silêncios e a Sombra esquece a língua inda não inventada.

São negras as madrugadas em que, cega, tento desvencilhar-me das teias do que não tive.

Resvalo pelo que me esconde a essência.

Traduzo porões. Engulo cicatrizes. Repito erros. Disperso-me, feito estátua de mercúrio.

Uma palavra me perde. Um juízo. Uma cruz. E os limites me alcançam, famintos.

Sou água, escorrida na semente. Não brota ela. Broto eu, no sangue do dia. Todos os dias.

Vertente invertida.



Eu, aquela que ardia.





26.07.2011 - 03h54min

Obtuso-me

Invado devagar
devagar salvo as palmas
devagar não vou

fico.

Arrisco muito
quase tudo
e muito me afasto
quase de todo
no instante seguinte.

Não agrido
repito devagar
ao vagaroso ouvinte
o silêncio que petrifico.

Afundo
o beco.
Rasgo a hora.
Licencio a pergunta.

Mas a resposta não.

São redondas as pilhas de acertos
que eu não fui.

Estremeço e adiante sigo.

Eu
comigo.





26.07.2011 - 03h23min

Coleção

Coleciono palavras
intrusos vocábulos
substantivos vários.
Nos vãos dos espelhos
autorizo as frases
e adapto os dizeres.
Choro fácil
de lágrimas engolidas a custo.
Fácil rio
e amontoo vírgulas
misturadas a letras
matizadas de sal.


Coleciono palavras
nos olhos
nas pontas dos dedos
na saliva
nos ditos perdidos
e nos que não dou.


Só pra provar
quem manda

eu sou...






26.07.2011 - 02h43min

Encruzilhada

o mundo já não gira
vira a cabeça de lado
lança os ventos nas vestes
cambaleia nos sobrados
o mundo dá cambalhotas
meu corpo fechado anuncia a hora
agora tudo à volta importa
as portas abertas são livres
as liberdades, proféticas
o mundo abre as asas
canta no alto das árvores
e abraça as ruas estradas e trilhas

que eu não abri


no meio da encruzilhada
descubro um mundo
que não sei



26.07.2011 - 02h20min

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Abertura

E se as palavras aliviarem
a insistente tristeza instalada
alcançaremos enluarada vitória
entre as conchas das mãos espalmadas.

E se os risos forem constantes
e as condições permanentes
talvez vejamos nascer uma chance
de fazer com que tudo seja diferente.

Rimas, orvalhos, defeitos
confessos ou não nas letras
nos desenhos estrelados
ou ventos soprados nas janelas
plantados nuns versos devassos.

Eu planto sementes
tu decides se elas vingam...
Ou não...





25.07.2011 - 02h38min

quarta-feira, 20 de julho de 2011

À força

À força
as ondas espumam as águas
o sol alaranja o Guaíba
os olhos encerram a madrugada.
À força
os orvalhos umedecem flores
os bailes acendem os olhos
as lembranças nascem amigas.
À força
as distâncias rasgam entradas
os poemas pingam fatos
as estradas pintam existências.

À força
o sono se alimenta
de suave companhia.





20.07.2011 - 01h30min

Memória

Desmemorizo-me
pra peneirar os nervos
lembro aleatórias cenas
idas e vindas neurônicas
elegâncias passadas
invisibilidades minhas.
Movimentos da vida
que rola morro acima
                               te
                        men
                    te
               ten
           mi
       ter
   in
sem pedir licença
sem caber nas mãos
sem desculpas
ou razões outras
que não aquelas
que a memória aprovou.







20.07.2011 - 01h20min

sábado, 16 de julho de 2011

Arte

Minha arte é caco de vidro no sapato
estrada de brasas
que trilho descalça
pra não esquecer um verso sequer.
Minha arte
longe de conhecimento
é compulsão
necessidade imperativa
hiperativo verbo que brota
sem aviso
nem rendição
em tempo algum.
Minha arte exige tudo
e de todo fácil se desfaz.
É silêncio e escuta
brevidade longeva
detalhe e escândalo azul
destituída de pureza ou escravidão.
Escrava sou eu, dela.
Ela vem e se esvai quando quer.
Ela sopra, bendiz ou amaldiçoa
quando bem lhe apraz.
Minha arte é o desenho na janela
dessa minha vida
eternamente fechada
para o constante.
Caco de vidro
caco de telha
caco de instante
que me corta o pulso
e sangra
dissonante
feito fio de navalha vencida
na carne da folha branca.





16.07.2011 - 14h07min

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Poesia

Fértil é o dia
em que brotam letras
bolhas de sabão
grafitadas
na folha virgem medida.
Qualquer motivo é verso
a ajuda pedida
e negada
o botão entreaberto
o aperto no peito
a linha do trem
a nova oração
o espelho quebrado
o medo invertido
a emoção.
Qualquer razão é bastante
o dente do siso
a farda verde
o fardo dormente
a circunstância
a pompa
o absurdo
o inconsequente.
Qualquer imagem é presente
inclusive a de mil novecentos e oitenta e cinco
ou antes
ou dois mil e onze.
Fértil nascença de estrofes.
Alimento.







14.07.2011 - 19h55min

Possessão

A realidade que eu guardo
é a ponta do grampo
de uma fotografia
que o delírio me permite possuir.
O que meus dedos tocam
são meus minutos-limites:
é o que eu tenho de meu.
Meus sobrepostos pertences
estão no meu hoje.
Meus remendos
imprestáveis pressupostos
de esquecimentos.
Eu sou o que hoje guardo
nas entrelinhas
das minhas medidas
feixes de nervos expostos.
Exporto dicionários
de cicatrizes perfeitas
e sinônimos duvidosos.
O que adivinho
o que suspeito
imagino
sonho
ou desejo
é ilusão.
O que me esvai dos dedos,
lembrança.
O que tenho
de fato e de direito
é o agora
e é nele que eu me liberto
é dentro desse mito
que eu moro
e suo
e sou.



14.07.2011 - 18h35min

Crença

Rasuras nas luvas
com que o vento
conta as gotas de hoje
nas íris embaçadas
das catedrais brancas
que esperam fiéis.
Contratos rasgados
incendiadas preces
violentas cenas paradas
nas veias fechadas
de uma América outra
que não a latrina
que não o latido uivado
d'alma desesperada e aflita
presa em si mesma
ensimesmada
loucura.

Rabisco.




14.07.2011 - 01h44min

Jamais

Nunca
é um tempo de por enquanto
que se arrasta ao longe
das gotas lânguidas
do escorrido relógio
de Dali. Daqui
nada se vê
além de agora
e o que não penso
é quase estrada trilhada.
O Nunca afirmado
pode ser Sim ou Não
depende da distância
entre o Sempre e o
tiquetaquear da vontade
prevista ou In.
Nunca é um tempo de por enquanto
enquanto durar a hora
arrastada de cascalhos
e repentes chuviscos
rebentos de listras azuis
nas calhas encarceradas
que pingam esperas
e corredores vazios.
Por enquanto
inda insta o orvalho
que não mais se esvai
nas frases do tempo
escoado dos quintais
da vida de dentro de mim.
Por enquanto
o Nunca aguarda
a calçada despretenciosamente
limpa
ventanear outonos
de folhas amassadas
e desistentes esperanças
tidas.
Nunca
é agora
por enquanto.


14.07.2011 - 01h04min

quarta-feira, 13 de julho de 2011

A paga

Aqui se faz
aqui se paga o preço pedido
sem pestanejar
ou tremer de mãos
os freios
os suores
as instâncias.
Aqui se faz
aqui se paga o preço justo
sem delongas
nem desculpas
ou equívocos
independentes das nossas juras.

Aqui se faz
aqui se paga a justa medida.

Agora.



Aos 9 segundos do dia 13.07.2011

terça-feira, 12 de julho de 2011

Heteronimozar-se

Tal Pessoa
invento-me diferente
ora sou forte
ora minguante
ora invisto na letra
ora disfarço de mim.
Se agora rio
daqui a pouco visto patins
calço máscaras
rasgo limites.
Se agora o pessimismo
define meus rumos
alimento as crenças
crianças descalças
rock pesado
remédio pra dor.
Se agora me falta a linha
monto parâmetros
desfaço arredores
interno hospícios
externo estilos
somo concretudes.

Longe de Pessoa ser
Pessoa sou
Se não
for, faço-me...



Aos 16 minutos do dia 12.07.2011

sexta-feira, 8 de julho de 2011

sábado, 2 de julho de 2011

Teoria

Pouco aprendi
do quase nada que me foi buscando
uma ponta aqui
outra ali
extrapolando
limites já gastos
impostos
pela história
que eu vivo aqui.

Os dias que me atravessam a garganta
são cordas do universo paralelo vocal
que me acompanha. Não
sei d'onde vim
mas sei daqui
desse comboio de metáforas diárias
metamorfoseadas em Kafkas, Shoppenhauers e Rilkes
enrolados à tua língua
que maldiz esse meu defeito
de te pendurar uma chave ao pescoço
e ordenar:
liberta o calabouço!




02.07.2011 - 18h

Pingos

Meus "is" perderam os pontos
cardeais
desnorteados
vestiram um gole de horizonte
e se acomodaram
no meio da profecIa.


Foi o fIm.





02.07.2011 - 13h44min

A partir daí

A partir daí
os lisos lenços d'areia
dispersaram o espaço
dispensaram o tempo
toques silenciosos na retina
crendice d'alumínio
fruteira sobre a mesa de mármore cru
frio de morte
a partir daí.

No entorno
as prioridades todas
alinhadas por importância
por mérito alencadas
nem um descarte
nem um deslize
nenhum desligue


a partir daí.






02.07.2011 - 13h10min